Em 1984, Senna ganhou corrida em que todos os pilotos usaram o mesmo carro
Todas as equipes da Fórmula 1 constroem seus carros seguindo um rígido protocolo de especificações. Alguns elementos precisam ser idênticos, seja qual for o carro. Mas há detalhes que podem mudar e que são decisivos para um bom desempenho na pista. É por isso que é comum ouvir que um “carro está melhor que outro”.
(Era algo ainda mais comum antes da adoção do teto de gastos, uma regra que estipula um limite de investimento nos veículos. Antes disso, grandes equipes como Ferrari e Red Bull gastavam o triplo do que times menores, como a Williams.)
Mas, afinal: e se tirássemos esse elemento da equação? E se todos os pilotos dirigissem o mesmo modelo de carro?
Em 1984, a Mercedes lançou o clássico Mercedes-Benz 190 E 2.3-16, um sedã de alto desempenho com motor de quatro válvulas por cilindro e capacidade de acelerar de 0 a 100 km/h em oito segundos. Para divulgar o veículo, a Mercedes fez três unidades que ainda estavam em pré-produção rodarem 50.000 km no circuito de Nardo, na Itália, a uma média de 247 km/h.
Mesmo assim, a popularidade não parecia suficiente. O marketing precisava ser mais agressivo.
Em 12 de maio de 1984, a marca resolveu organizar uma “corrida dos campeões”, que reuniria feras da Fórmula 1 para andar no novo carro. O evento marcou a reabertura do icônico circuito de Nürburgring, fechado após anos de acidentes (o estopim foi o que quase matou o piloto Niki Lauda, em 1976).
O circuito era conhecido como ‘Green Hell‘, (do inglês, Inferno Verde), devido ao seu design arriscado e florestas densas, e tinha 24,4 km de extensão, com subidas, descidas e muitas curvas. A reconstrução foi concluída naquele ano, permitindo o retorno das competições no local.
A Mercedes queria se destacar nesse fim de semana para promover sua marca e expandir seus negócios. A montadora convidou os 20 melhores pilotos para competir com o Mercedes-Benz 190 E. Prato cheio para os fãs.
Primeiro, a empresa chamou todos os campeões mundiais (na época, existiam apenas 14). Mas, nem todos estavam com a agenda vaga. Emerson Fittipaldi, outro brasileiro memorável do automobilismo, por exemplo, estava se preparando para correr as 500 Milhas de Indianápolis, nos EUA. Só nove campeões marcaram presença.
Para ocupar as vagas faltantes, outros motoristas foram chamados. Quando restava uma vaga para a corrida, Fittipaldi recomendou para os organizadores do evento o jovem Ayrton Senna, que naquele ano fazia sua estreia na Fórmula 1 com a equipe Toleman.
Os modelos da Mercedes passaram por algumas modificações para a corrida, como no sistema de escapamento, suspensão rebaixada e freios de quatro pistões. Mas o ponto é: todos andariam com modelos idênticos por 12 voltas em um circuito renovado, público de 100 mil pessoas e chance de chuva.
A corrida
A etapa de classificação foi dominada por Alain Prost, que conquistou a pole position com o tempo de 2:05.92, enquanto Ayrton Senna ficou em terceiro lugar com 2:06.45.
Era esperado que Niki Lauda fosse o protagonista da corrida (em grande fase, ele venceria o campeonato de Fórmula 1 naquele ano). Embora tenha se qualificado em 14º lugar, Lauda fez uma impressionante recuperação na primeira volta, chegando ao quarto lugar e logo perto de Senna para tentar ultrapassá-lo.
As voltas seguintes tornaram-se uma disputa entre os dois pilotos pelo primeiro lugar, com ambos se alternando na liderança. A batalha continuou até que um deles se destacasse como o melhor nas 12 voltas. Ayrton Senna mostrou uma habilidade de pilotagem impressionante, sendo astuto e ousado, acelerando sem deixar espaço para os adversários e não subestimando nenhuma volta.
Como?
Quando um piloto controla suas entradas em curvas de forma harmoniosa, ele utiliza toda a aderência dos pneus, dirigindo no limite ideal para entrar nas voltas mais rapidamente. Enquanto outros pilotos ultrapassavam esse limite, Senna mantinha uma condução precisa nas curvas, equilibrando perfeitamente seu carro.
Pouco antes do final da corrida, Senna ultrapassou Lauda, garantindo a vitória na Race of Champions com uma vantagem de três décimos.
É claro que não dá para levar essa corrida totalmente a sério. Por ser um evento fora do calendário competitivo e funcionando mais como uma campanha de marketing da Mercedes, alguns dos pilotos não colocaram tudo de si ali. Mas alguns sim, caso de Senna, cuja performance serviu para chamar ainda mais a atenção dos fãs de automobilismo.
13 dias depois da corrida da Mercedes, o brasileiro fez uma performance impressionante no complicado circuito de Mônaco. Senna se tornaria o maior vencedor desse GP (seis vitórias) e tricampeão da Fórmula 1.
O Mercedes-Benz 190 E 2.3-16 com o qual ele venceu, foi enviado diretamente para o museu da marca em Stuttgart. O modelo de número 11 permanece em condições originais desde o final da corrida.
E por falar na prova, você pode assisti-la aqui:
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