Novidade no Uruguai é o centro no domínio do governo e do parlamento
Quatro décadas depois da transição para a democracia, o Uruguai apresenta uma novidade: a estabilidade prossegue, lastreada na inibição do radicalismo e da desqualificação de adversários, mas, agora, sem que nenhum grupo possua maioria política claramente definida.
Nove em cada dez uruguaios aptos votar foram às urnas neste domingo (24/11), um índice de participação expressivo para os padrões da América do Sul.
Elegeram Yamandú Orsi e a vice Carolina Cosse, líderes de centro-esquerda do Movimento de Participação Popular (MPP). Nesta etapa, o MPP comanda a Frente Ampla, composta por frações de social-democratas, socialistas, comunistas e movimentos cristãos.
Perderam Álvaro Delgado e Valeria Ripoll, da Coalizão Republicana, formada por partidos de centro-direita. Representavam o governo de Luís Lacalle-Pou, um liberal com alta popularidade.
Como tem sido frequente na América do Sul nos últimos sete anos, o Uruguai escolheu mudar o governo. Em tese, representa mudança de rumo.
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Desta vez, no entanto, a nova direção uruguaia não está clara. Os candidatos do governo e da oposição, durante a campanha, não estabeleceram com nitidez as diferenças entre suas propostas para o país, principalmente na economia. A maior controvérsia é sobre os métodos de gestão dos programas sociais.
Do ponto de vista dos uruguaios, não parece ruim. Eles impuseram um equilíbrio de forças, a rota da negociação obrigatória dentro do governo e do parlamento. Aparentemente, foi o que levou o governista Delgado a tentar animar seus eleitores diante do resultado das urnas: “Uma coisa é perder as eleições, outra é ser derrotado, nós não estamos derrotados.”
A vitória de Orsi (49,8%) por uma diferença de quatro pontos percentuais em relação a Delgado (45,8%), no segundo turno, também renova o aval dos eleitores quanto a decisões consensuais sobre o futuro do país que, em proporção, possui na população um dos maiores contingentes de classe média na América do Sul.
O principal é o valor da democracia e, nele, a igualdade como base para desenvolvimento econômico eficiente. Numa economia centrada no agronegócio, pressupõe expansão de mercado externo. A consequência natural é a persistência uruguaia na revisão das práticas do Mercosul – ditadas e preservadas com rigidez pela hegemonia Brasil-Argentina.
Para Orsi, o Mercosul precisa de “dinamismo” porque parou no tempo, estacionado na “esclerose”. Essa é uma “questão nacional”, assunto de Estado, repetiu durante os últimos quatro anos o presidente Lacalle-Pou. Há mais de duas décadas, governo e oposição mantêm a premissa de que Brasil e Argentina bloqueiam o caminho do Uruguai para acordos de livre-comércio à margem do Mercosul. O exemplo mais citado é o da China.
Orsi e Lacalle-Pou assistem, na primeira semana de dezembro, a uma reunião de cúpula do Mercosul. Espera-se que nesse encontro seja confirmado o tratado de livre-comércio com a União Europeia, negociado em 1999, confirmado em 2019 e até hoje não assinado. Para o Uruguai há vantagens. A assinatura, agora, só depende de decisão da Comissão Europeia, que é politicamente independente. Pode aceitar o acordo, apesar das pressões contrárias da França, e, em seguida, enviá-lo ao Parlamento Europeu para ratificação.
Ursula von der Leyen, presidente da comissão, tem reservas de hotel em Montevidéu para o período da cúpula do Mercosul. Não quer dizer muito, porque, no ano passado, ela se preparou para viajar e assinar o tratado no Uruguai. Na véspera, cancelou e ficou em Bruxelas.
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